sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Crônicas sobre o Mundo do Trabalho #4



Estava conversando com um amigo, outro dia, e ele me perguntou o porquê de eu estar fazendo Comunicação Social. Eu já troquei de opinião algumas vezes quanto ao que eu queria ser quando crescer durante a minha vida – ou pelo menos até os meus 18 anos, quando eu decidi que queria ser jornalista. A primeira profissão que eu me lembro de ter vontade de seguir foi a Contabilidade. Quando eu tinha 7 ou 8 anos – talvez influenciado por um tio que era contador – enfiei na minha cabeça que era isso que eu queria ser. Acabei me desanimando um pouco aos 11, quando eu descobri quanto um contador ganhava, mas eu só desisti mesmo aos 12, quando eu descobri o que um contador fazia.


Dos 12 aos 15, junto com a pré-adolescência e a insegurança e falta de personalidade típicas de um pré-adolescente, vieram também uma série de profissões que, por algum momento, eu desejei ter. Nessa época eu quis ser médico, professor de Educação Física, apresentador de talk show, programador de computadores e etc. Sabe como é que é, quando você é criança o que te dizem é que você pode “ser o que quiser quando crescer”. 

Foi aí quando eu decidi fazer prova para alguma escola de formação técnica, dessas que limitam suas expectativas de vida de “ser o que você quiser quando crescer” para “a gente tem essas 5 opções”. E eu escolhi Eletrônica, com o intuito de sair de lá, fazer prova para alguma faculdade e tentar me formar em Engenharia. A pré-adolescência costuma ser a época em que você começa a se interessar por garotas, e Engenharia é um bom caminho pra quem se interessa em garotas.

Quando eu entrei na Escola Técnica Estadual Visconde de Mauá – o lugar onde eu cursei o meu Ensino Médio – eu soube que aquilo era o que eu não queria fazer da minha vida. Mas a minha falta de coragem aliada à minha vontade de começar a ganhar dinheiro cedo, me impediram de largar o “Mauá” e ir estudar em um colégio normal.

Três anos se passaram, eu terminei o Ensino Médio e, aos 17 anos, comecei a procurar trabalho para cumprir os 6 meses de estágio necessários para quem quer ganhar um diploma. E no dia 3 de maio, quando eu fazia o meu 18º aniversário, eu escutei pela primeira vez alguém dizendo “Você está contratado”, dirigindo-se especificamente à mim. Fiquei mais feliz do que eu imaginava, até porque, diferentemente dos outros 4 estagiários que foram contratados junto comigo, eu iria desempenhar uma função especial – e ganhar mais 100 reais/mês por isso.

Em vez de ficar na área mais técnica, enfurnado nos fundos da empresa, desempenhando funções como soldagem e... várias outras coisas, o dono da empresa, meu xará João (eu tenho que ter mais criatividade para criar nomes falsos), me disse que eu levava jeito com pessoas e que ele me via mais como alguém que diz para os outros como faz para consertar algo, do que alguém que, de fato, conserta. A partir daquele momento eu faria parte do grupo de assistência técnica especializada da empresa, que era formado por mim e por Carlos, um cara evangélico muito gente boa e com quem eu tive uma relação muito amigável nos meus primeiros dias na empresa, até ele se afastar um pouco de mim depois de me ver cantando a música Eu Sou 157, dos Racionais MC’s – ele era negro e, por isso, eu achei erroneamente que aquela era uma forma boa estratégia de aproximação.

Eu devia ter escutado a minha tia quando ela disse “Você não é bom com pessoas, João”. Mas o fato é que eu entrei de cabeça naquele estágio e já pensava em ser efetivado. Fiz 2 cursos sobre DVRs (Digital Video Recorders), ambos pagos pela empresa. Iria viajar para São Paulo, junto com o meu chefe e xará, João, para fazer outro. Pouco mais de um mês estagiando, eu já não aguentava mais ter que lidar tudo aquilo – definitivamente Eletrônica não era a minha praia – mas, quando o primeiro pagamento chegou eu passei a contar o dias para o próximo e isso me animou a continuar trabalhando lá.

Alguns dias depois eu tive uma discussão por telefone com um dos fregueses mais frequentes da loja, que estava reclamando que o DVR que ele havia comprado tinha vindo com defeito e já era a segunda vez que ele tinha ido trocar, mas sempre voltava com o mesmo maldito defeito. Eu não lembro o porquê de nós termos começado a discutir, mas a minha ultima frase foi “Pode vir trocar de novo, a gente não faz questão de DVR aqui não!”.

Talvez tenha sido por isso que eu fui demitido, uma semana depois. Pode ter sido também porque meu chefe e xará, João, descobriu que aqueles 15 HDs com “defeito de fábrica”, na verdade tinham queimado porque eu troquei a ordem dos fios quando fui instalá-los. 15 vezes. Seguidas. Mas eu divago. O fato é que, na metade do mês de junho, eu já não fazia mais parte daquela empresa, mas tinha recebido um meu segundo salário integralmente, como dizia uma das cláusulas do contrato. Eu era tão ruim a ponto de me demitirem no meio do mês, mesmo sabendo que teriam que pagar o meu salário inteiro.

Depois de alguns dias me lamentando, resolvi então abandonar a carreira de técnico de Eletrônica, e não fazer Engenharia na faculdade. Decidi pensar minuciosamente no que eu queria ser quando crescer, agora com a adição do fato de que eu já era, digamos, grande. Acabei, então, por fazer o que todo mundo que não sabe o que fazer faz: Comunicação Social. Além do mais, a galera de Comunicação, principalmente da UFRJ (ECO), é conhecida por ter um papo cabeça, e naquela época eu estava nessa fase de gostar de um papo cabeça – hoje em dia eu acho um saco. Era uma oportunidade de eu me relacionar pessoas que gostam de Tarantino e Strokes – hoje em dia eu não gosto tanto de Tarantino e Strokes.

Lógico que tem a famosa barreira que as pessoas que fazem Comunicação costumam dar de cara: a baixa empregabilidade e os salários pequenos. Mas morar sozinho, pagar as contas em dia e ter um carro são coisas superestimadas, de qualquer forma. Ter uma família, também. Quem precisa de uma casamento estável e filhos quando você pode ser moderno e solteiro aos 50 anos como todos os professores universitários?

Tem também toda essa questão de eu não ser “bom com pessoas” e etc. O que é muito relativo. (Aliás, isso você aprende fazendo um curso de Comunicação: dizer que algo é “relativo” quando você não tem mais argumentos.) Além do mais, se eu não sou bom com pessoas, um curso de Comunicação Social é o melhor lugar para aprender isso, não é verdade?
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Portanto, quando meu amigo me perguntou o porquê de eu estar fazendo Comunicação Social, não consegui pensar em nada concreto. Até porque pensar em algo concreto não costuma ser uma característica de quem faz Comunicação Social. O lado bom de fazer esse curso é que quanto menos talento você acha que tem para isso, mais parecido com o perfil de um profissional padrão de Comunicação você é. Talvez porque os profissionais de Comunicação são justamente assim: desprovidos de talento. Mas ao mesmo tempo, são imprescindíveis para o funcionamento de um mundo que cada vez mais se comunica. Dá pra entender?

É como se a presença dos comunicólogos no mundo contemporâneo fosse equivalente à presença da orelha no corpo humano. Sabe, ninguém tem muita certeza do porquê da orelha existir. Importante mesmo é o ouvido. Mesmo assim, ninguém quer sem o cara que não tem orelhas. Seria estranho.


João Carlos

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